sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

MEMÓRIA DO CARDEAL LORSCHEIDER

Dom Sinésio Bohn *
Durante o Concílio Ecumênico Vaticano II eu era estudante em Roma. Dom Vicente Scherer, Arcebispo de Porto Alegre, estava em Roma e com freqüência ia ao Colégio Pio Brasileiro para conversar com os seminaristas. A gente fazia pra ele um “café batido”. Como ele gostava.
Certo dia Dom Vicente me perguntou: “O senhor sabe como chegar ao Colégio Santo Antônio dos frades franciscanos”? Como sabia, fui com ele. Durante o caminho ele me segredou:”Fui incumbido pela Santa Sé de convencer um jovem frade a ser bispo de uma diocese nova”. Os dois conversaram e voltamos ao Colégio Brasileiro. Dom Vicente me confidenciou: “Fui bem sucedido”. Pouco depois (em fevereiro de 1962) o frade – Dom Aloísio Lorscheider – foi nomeado primeiro bispo da nova Diocese de Santo Ângelo (RS).
Durante as solenes exéquias de Dom Aloísio, na Catedral de Porto Alegre (dia 26/12/07), na presença do Núncio Apostólico, do Cardeal Dom Odilo Scherer, do Presidente da CNBB, da Governadora do Rio Grande do Sul, do Governador de São Paulo, de outras autoridades e bispos, padres, pastores evangélicos e representantes de várias religiões, de repente o povo cantou um canto em alemão: “Grosser Gott wir loben Dich” (Deus imenso Criador). É que Dom Aloísio nasceu nas planícies do Rio Taquari, na Linha Geraldo, entre os municípios de Estrela e Teutônia. Uma região típica de imigrantes alemães, católicos e evangélicos luteranos. De modo que Aloísio, desde criança, conheceu a tradição religiosa católica e luterana. Mais tarde ele criou o Departamento de Teologia e Ecumenismo da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil).
E em casa falava um dialeto alemão, vindo a aprender o português na escola.
Aliás, faz uns cinco anos, Dom Aloísio me pediu que o levasse à Vila Palanque (Venâncio Aires – RS), onde quis se encontrar com os amiguinhos de escola, pois a família morou um tempo em Palanque. Saiu um “café colonial” com um grupo de idosos, maravilhados com a cordialidade do menino Lorscheider, agora um cardeal importante, que “quase ficou papa”.
Foi na família que Aloísio formou suas convicções básicas de fé e de boas relações com o próximo, a começar pelos irmãos. Todos os biógrafos acentuam sua inteligência privilegiada, seu caráter íntegro, sua bondade de coração, sua firmeza na defesa dos direitos humanos (durante a ditadura militar era difícil), seu amor à verdade, o apego ao Evangelho como critério de vida e de pastoreio, a fidelidade à fé e a Pedro (o papa) e ao Concílio Ecumênico Vaticano II, a capacidade de diálogo e o amor aos pobres.
Dom Aloísio ocupou os cargos mais importantes na Igreja do Brasil (Secretário da CNBB e duas vezes Presidente) e do Continente (Presidente do CELAM – Conselho Episcopal Latino Americano). Permaneceu humilde, serviçal, irmão entre irmãos. Morreu com o habitual sorriso nos lábios. Um homem bom, íntegro, discípulo de Cristo. Um exemplo a seguir.
* Dom Sinésio Bohn é bispo de Santa Cruz do Sul
CNBB

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